12 de dezembro de 2005

Um lápis e uma borracha

Lembro-me daquele lápis por afiar, todo cheio de marcas dos meus dentes e com uma cor que era produto da reacção entre a minha saliva e o surro das mãos por lavar. Na ponta contrária, lá estava uma pequena borracha, aquela que me ajudou a ser quem sou hoje, tanto jeito que ela me fazia.
Quando reparo no modo como agora escrevo, vejo naquilo que me tornei. Passo o dia de caneta na mão, onde constantemente escrevo uma sucessão de palavras em função daquilo que penso, não em cinzento mas em vermelho. Dantes nada era assim. Lembro-me que quando aprendia as primeiras letras, meio que com a língua de fora e o cabelo despenteado, me desdenhava para escrever uma simples linha. Uma linha que expressava toda a pureza, e que apesar das letras tortas, sei que o fazia sempre bem, porque o fazia simples e com a razão.
Hoje acho que são poucas as coisas que faço a lápis, pelo menos parece que tudo o que faço em função de ti, é escrito a caneta e a vermelho. Não sou capaz de usar o lápis, porque sei que se escrevesse o teu nome a lápis, a borracha o iria apagar de imediato. Não porque ela não gosta do teu nome, mas porque sabe que eu não o escreveria com a razão.
Já não aguentava nem mais um dia, sempre na indecisão, se haveria de escrever a lápis em tons de cinzento ou a caneta em tons de vermelho.
Tinha que sair do Porto!
Era pleno Dezembro e estava mesmo a precisar de ir à praia apanhar umas ondas, ou melhor, voar sobre terreno líquido, voar daqui para fora.
Já estava na água à cerca de uma hora, quando reparei que como pano de fundo, tinha o pôr do sol, algo raro às 17h10.
Atravessei a zona de rebentação só para ficar a olhar o sol lá bem ao longe. Aos poucos o sol ia-se pondo e eu deixei-me hipnotizar pela imponência do seu reflexo nas ondulações. Lembro-me que quando tinha 4 anos, sempre que ia à praia, tentava agarrar todo o mar com uma só mão, apertava com muita força e tudo o que eu conseguia, era reunir algumas gotas...
Hoje também me apetecia agarrar-te, tal como fazia em criança, com toda a minha força, mas tudo aquilo que eu consigo, são alguns momentos...
Hoje sei que é no mar que encontro toda a verdade, que me encontro a mim e à razão. Mas porque será que venho tão poucas vezes ao mar...
Ao menos se eu pudesse mandar nisto...Ao longe oiço a voz de um amigo que me chama para ir embora, já está a ficar de noite.
Pronto, já estou a ver no que vai dar, é sempre a mesma coisa. Aposto que a certeza que tive enquanto boiava em cima da prancha e era iluminado pelo sol alaranjado e bolachudo, se vai assim que eu sair de água, assim que ficar escuro, assim que sentir a tua falta, assim que prescindir do lápis, assim que me apetecer mandar-te uma sms e escrever a vermelho. E porquê? Isso já eu te perguntei, ao que tu me respondes-te...
“Uma folha de inverno, velha e seca, não pesa nada, voa com o vento e passa indiferente a toda a gente.
Um milhão de folhas de inverno, velhas e secas, pesam uma enormidade, só saem de empurrão e nem tu nem eu temos força para as empurrar...”

Uma voz um dia disse-me: - Pode ser que um dia leves o mar para casa, algo que não é assim tão fácil, a não ser que vás viver para a praia. Mas será que aí o teu problema não se mantém?
Só mais uma coisa. Dá-te feliz por teres a sorte de viver esse dilema!

1 comentários:

Anónimo disse...

Gostei...Transmitiste inúmeros significados no meio dessas entrelinhas todas!!Também gostei sempre mais dos lápis, são mais genuínos, conseguem transmitir emoções...se escreveres algo a lápis e depois apagares a tua marca ficará infinitamente lá!!!Já escreveste, já sentiste, já viveste...já ficou marcado...
A precariedade dos momentos é impressionante, mas são esses momentos que nos mantém vivos, que alimentam as nossas paixões e emoções!

Beijos..