7 de dezembro de 2009

Liberdades individuais




Fechado em casa e embrenhado no cinzento que cobria momentaneamente o sol das duas da tarde, ele agarrou na guitarra.
Instintivamente começou a tocar algo que corroesse e abrisse ainda mais a sua ferida.
Tocou, tocou, tocou para si e para mais ninguém.
Tocou até não sentir mais as cabeças dos dedos da mão esquerda que hoje e só por hoje, se tinha vestido a rigor da ocasião.

...

O sol começou a espreitar e com ele se foi a apatia alimentada aos acordes daquela música triste.
Pousou a guitarra em cima da cama ainda desfeita, levantou os estores e abriu a janela.
Lá do cimo do 5º andar, respirou aquele ar amornado pelo sol de início de tarde, enquanto olhava a sua mota lá em baixo.
Vestiu um par velho de calças de ganga, uma t-xirt branca e o seu blusão de cabedal deixando-o aberto.
Agarrou nos seus óculos de sol, no capacete preto que há semanas guardava o pó debaixo da cama e nas chaves de casa.
Desceu as escadas a correr, amparando todos os desequilíbrios com encontrões contra as paredes, até que por fim chegou ao rés do chão e abriu a porta para a rua.
Em câmara lenta, foi andando até ela.
Guardou as chaves no seu bolso direito, olhou os prédios em redor, colocou cuidadosamente o capacete e os óculos escuros e sentou-se em cima da mota.
O céu abriu definitivamente, como há muito não o via.
Não viu mais nada, ligou a mota, em ponto morto acelerou duas vezes e nunca mais ninguém o viu.


1 comentários:

Anónimo disse...

Baseado em factos reais;)